Quarta-feira, 27 de Julho de 2005
Sexta-feira, 10 de Setembro de 2004
Tão importante como as impressões de uma viagem é esta possibilidade de podermos recuperar mais tarde as sensações e as ideias que dela emergiram. Ao partilharmos com os outros esses momentos é como se tivéssemos uma segunda oportunidade. É assim como eu sinto a discussão que o
Manuel reeditou motivado pela efervescência dos artigos de opinião de M. F. Mónica, A. Barreto, entre outros que têm vindo a público falar da coisa educativa.
Quem entrou agora nesta carruagem em que nos encontramos talvez desconheça que esta viagem começou com uma discussão em torno da uma ideia: a recuperação da Escola Cultural como paradigma pedagógico susceptível de ser concretizado no actual figurino organizativo do sistema educativo. Procurei assinalar algumas das disfuncionalidades e paradoxos do actual sistema educativo que afastam cada vez mais a escola normativa da escola situada. (
http://arcanjo.blogs.sapo.pt/arquivo/2004_01.html#013814http://arcanjo.blogs.sapo.pt/arquivo/2004_01.html#014177http://arcanjo.blogs.sapo.pt/arquivo/2004_01.html#014500http://arcanjo.blogs.sapo.pt/arquivo/2004_01.html#015030http://arcanjo.blogs.sapo.pt/arquivo/2004_01.html#015119)
Hoje continuo a deixar-me guiar pela mesma utopia mas pressinto que a educação é conduzida no sentido oposto.
Os exemplos que se afiguram nos outros países de pouco valem. Nessa medida o
Manuel tem razão. Comparar, só o que pode ser comparado. O meio século de obscurantismo não justificará tudo. Mas não podemos continuar agarrados ao daltonismo cultural em que fomos socializados. A Sociologia da Educação ajuda-nos a perceber que o percurso histórico político e cultural de um país não pode ser decalcado.
O exemplo da Finlândia vale o que vale. Servirá para admirar, questionar, reflectir e suscitar a discussão.
Para finalizar esta conversa deixem-me introduzir um exemplo do mundo futebolístico que serve para sublinhar a finitude dos modelos. José Mourinho (para quem nunca ouviu falar, o homem foi campeão europeu de futebol na época transacta por uma equipa aqui do Norte) apareceu no meio futebolístico e num ápice desmistificou a ideia hegemónica acerca do perfil treinador de futebol. Afinal o homem como ex-praticante de nível mediano não cumpria os preceitos que lhe estavam reservados. Supostamente, o treinador de futebol teria de cumprir o seu destino. Ser um treinador de nível mediano. Nada melhor do que deixar a realidade contestar a ficção. O caricato desta questão é que muitos acreditam, porque são pessoas de fé, que o segredo do sucesso se encontra aí mesmo. Na própria fé.
Quinta-feira, 9 de Setembro de 2004
As angústias e os pesadelos que emanam das disfuncionalidades das escolas, deixam marcas que magoam e corroem, obrigam-nos a protestar, reprimir, silenciar ou, em alguns casos, fugir.
Nos momentos de acalmia, olhamos à nossa volta e reparamos que não estamos sós. Talvez porque se procura enganar a fadiga e dar tempo à recuperação, o desejo de procurarmos no outro e na profissão do outro afinidades e pontos de ruptura com esta profissão de professor permite-nos situar.
Isto a propósito de um texto do
Henrique que fala da prepotência, da impunidade, do atropelo às regras democráticas, dos
acólitos.Paradoxalmente,
é na avaliação da perversidade que encontro motivos para estimar a minha profissão. É o momento em que os exemplos dos outros nos ajudam a perceber o que significa liberdade de expressão. Que corporativismo é este que permite que estes exemplos sejam publicitados, discutidos, censurados quando atentam contra as regras elementares de civilidade ou fazem tábua rasa dos normativos legais?
Uma Ordem?...
O exemplo da Finlândia não costuma vir muito à baila nestas discussões, mas é muito interessante. Só alguns dados: os mesmos anos de escolaridade; entrada na escola só aos sete anos; sistema de um só professor até ao sexto ano; não há exames (só para entrar na universidade ou politécnico); os programas são mínimos, sendo dada às escolas e aos professores liberdade para ensinar como e o que quiserem; poucas escolas privadas; todos os professores têm mestrado, pelo menos; ensino profissional secundário bastante desenvolvido; se não estou em erro, mais de cerca de 70% acaba o secundário (não é obrigatório); uma grande percentagem passa ao ensino superior. O país ficou em primeiro lugar do célebre PISA, que avaliou a literacia e a numeracia. Tudo isto sem grandes discussões, neoliberalismos, radicalismos ou saudosismos. Os Filandeses dizem apenas que fazem o que acham que é mais sensato e, devido à curiosidade de que foram alvo aquando dos resultados do PISA, esperam ficar em 2º ou 3º lugar no próximo estudo.
(Comentário anónimo)
Quarta-feira, 8 de Setembro de 2004
Ministra da Educação Pode Incorrer em Pena de Desobediência."A ministra da Educação pode vir a ser alvo de procedimento criminal por não ter respeitado as providências cautelares decretadas pelos tribunais no âmbito do concurso de professores. Isto para além de outras sanções previstas no Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) que os juizes decidam eventualmente aplicar" (Continuar a ler aqui.)
Sapo estás perdoado!
Para além do que retiro dos artigos de João Vasconcelos Costa na imprensa e no
Professorices, o processo de Bolonha é para mim um grande enigma. As notícias da imprensa enfatizam a redução temporal dos graus académicos reforçando o valor trabalho. Se o motivo principal da mudança é claro, o mesmo não se poderá dizer dos efeitos que a mudança suscitará na estrutura educativa. Obviamente que esta discussão não se irá circunscrever ao ensino superior. Ela alastrar-se-á por toda a pirâmide do sistema educativo. De cima para baixo. Aliás, é habitual que as reformas ou mudanças do nosso sistema educativo tenham sentido único.
MJMatos na sua profícua pesquisa pela imprensa da actualidade educativa deixa-nos este registo do
Diário Económico. É uma entrevista ao coordenador responsável pela apresentação de uma proposta de revisão do sistema de graus, para implementação dos Processo de Bolonha, nos cursos de Economia e Gestão.
Quero destacar da entrevista o seguinte:
Existem duas condições a ponderar na decisão de reduzir a duração do 1º ciclo de formação - licenciatura - para três anos.
A primeira, e talvez a mais importante, é saber se os estudantes portugueses concluem o ensino secundário tão bem preparados como os restantes alunos dos outros países europeus. A resposta a esta pergunta é fundamental para saber se é possível formar diplomados para entrar no mercado de trabalho com apenas três anos, como acontece em outros países. Outra questão consiste em conhecer o grau de articulação entre os ensinos secundário e superior.
Atente-se a um aspecto de menor importância destapado pela minha curiosidade pelo trabalho jornalístico. A minha simplicidade levar-me-á a pensar que não existe qualquer relação entre o brilhante percurso académico do coordenador que é patenteado na notícia com as controvérsias geradas em tornos dos exames nacionais. Talvez fosse necessário rematar a notícia e nada melhor do que o pretenso mérito académico do entrevistado.
O professor que fez o liceu em três anos.
António Romão fez o prodígio de concluir os sete anos do liceu em apenas três. Conseguiu fazer os exames do 2º, 5º e 7º anos, como aluno externo do liceu, em apenas três anos. Começou a trabalhar aos 16, mas uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) permitiu-lhe voltar a estudar. «Se não fosse a Gulbenkian, talvez não tivesse estudado», confessa.
Os professores do ensino básico e secundário têm sido fustigados com mudanças iníquas no sistema educativo. Receio que o antídoto para lidar com essa entropia passe pela alienação.
A propósito de uma discussão inacabada com o
Manuel sobre a emergência de uma nova escola lanço este breve olhar, ou um desafio se o entenderem como tal.
As discussões sobre a Escola realizadas intra-muros não fazem parte da agenda dos professores. Admito que esta generalização é abusiva porque decorre da minha experiência profissional, dos encontros justificados pela coisa educativa, do pulsar manifestado na blogosfera. Não me interessa, nesta ocasião, procurar as causas do afastamento docente apoiando-me em estudos ou publicações.
A pergunta que eu coloco é a seguinte:
Será que o professor está votado à sua condição de operário acrítico e arredado da possibilidade de ser ele próprio a decidir o sentido do seu destino?
Terça-feira, 7 de Setembro de 2004
A escola, por enquanto sem alunos, sacode o torpor das férias.
Encontros e reencontros, olhares que se cruzam, recuperam-se algumas ideias pendentes.
Há uma vaga conformista, um encolher de ombros, palavras para quê?
Ninguém duvida que a opinião pública será fustigada com a contra-informação. Tudo correrá conforme previsto, as aulas começarão no dia agendado, os alunos serão bem recebidos e guardados nas escolas.
O país do faz de conta parece ansiar por escolas a fingir.